quinta-feira, 17 de março de 2011

O SEGREDO DA VERDADEIRA OBEDIÊNCIA - PARTE 2


Por Andrew Murray


II. O LIVRO TEXTO

A direta comunicação que Cristo mantinha com o Pai não significou independência das Santas Escrituras. Na divina escola da obediência há apenas um livro texto, quer seja para o Irmão mais velho quer para a criança mais nova. No Seu aprendizado da obediência Ele usou o mesmo livro texto que nós temos de usar. Ele apelava à Palavra não somente quando estava ensinando ou procurando convencer os outros — Ele precisava dela e a usava para sua própria orientação e vida espiritual. Do início da Sua vida pública até o seu final, Ele viveu pela Palavra de Deus. “Está escrito” foi a espada do Espírito com a qual Ele derrotou Satanás. “O Espírito do Senhor Deus está sobre mim”: esta palavra das Escrituras era a certeza interior com que Ele iniciou a pregação do evangelho. Era à luz de “Para que as Escrituras se cumpram” que Ele Se resignava a todo sofrimento, e até mesmo Se entregou à morte. Depois da Sua ressurreição, Ele expôs aos discípulos “o que a seu respeito constava em todas as Escrituras” (Lc 24.27).

Nas Escrituras Ele encontrou o plano e o caminho que Deus Lhe havia traçado. Ele Se entregou para cumprir tudo. Foi na Palavra de Deus e por meio dela que Ele recebeu o contínuo e direto ensino do Pai. Na escola da obediência de Deus, a Bíblia é o único livro texto. Isso nos revela a disposição com que temos de nos achegar à Bíblia — com o desejo simples de encontrar nela aquilo que está registrado a respeito da vontade de Deus para nós, com o propósito de cumpri-la.

As Escrituras não foram escritas para aumentar nosso conhecimento, e sim para dirigir nossa conduta; “a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra” (2 Tm 3.17). “Se alguém quiser fazer a vontade dele, conhecerá...” (Jo 7.17). Aprenda de Cristo a considerar tudo que está nas Escrituras sobre a revelação de Deus, e do Seu amor, e do Seu conselho, como simples auxílios para o grande propósito de Deus: que o homem de Deus seja capacitado a fazer a Sua vontade, assim como ela é feita no céu; que o homem possa ser restaurado à perfeita obediência que o coração de Deus almeja acima de tudo, e que é, somente ela, a grande alegria.

Na escola da obediência de Deus a Palavra é o único livro texto. Cristo teve necessidade do ensino de Deus, e recebeu instrução de Deus para saber como aplicar essa Palavra em Sua própria vida e conduta, e para saber como posicionar-se com cada diferente porção da Palavra — se se aplicava a Ele ou não. É Ele que fala em Isaías: “Ele me desperta todas as manhãs, desperta-me o ouvido para que eu ouça como os eruditos” (Is 50.4). Mesmo assim, Aquele que dessa forma aprendeu a obediência, no-la ensina dando-nos o Espírito Santo em nosso coração como o divino Intérprete da Palavra.

Essa é a grande obra do Espírito Santo que em nós habita — aplicar a Palavra que lemos e na qual meditamos em nosso coração, e torná-la viva e poderosa ali, de forma que a palavra viva de Deus possa operar eficazmente em nossa vontade, nosso amor, em todo o nosso ser. É por não compreendermos isso que a Palavra fica destituída de poder para operar a obediência. Vou tentar falar sobre isso de forma muito franca.

Nós nos regozijamos no crescente interesse que existe no estudo da Bíblia, e com os testemunhos que ouvimos sobre o interesse renovado nela e nos benefícios recebidos por isso. Mas não nos enganemos. Podemos nos deliciar com o estudo da Bíblia; podemos nos encher de admiração e nos sentir encantados com as novas revelações da verdade de Deus; os pensamentos obtidos pelo estudo podem nos impressionar profundamente e despertar em nós os mais agradáveis sentimentos religiosos; e no entanto ser muito pequena a sua influência em nos tornar santos ou humildes, amorosos, pacientes, prontos tanto para servir como para sofrer. A razão por que isso pode acontecer é que não recebemos a Palavra como ela de fato é, como a Palavra do Deus vivo, que tem de falar conosco Ele mesmo, se é que ela deve exercer sobre nós o seu divino poder.

A letra da Palavra, embora a estudemos e nos deliciemos nela, não possui nenhum poder salvador ou santificador. A sabedoria humana e a vontade humana, embora redobrem seus esforços, não têm capacidade de dar nem de ordenar esse poder. O Espírito Santo é o grande poder de Deus: é somente à medida que o Espírito Santo ensina você, somente à medida que o evangelho é pregado a você ou por homens ou por um livro, “com o Espírito Santo enviado dos céus”, que ele realmente há de lhe dar, com cada mandamento, a capacidade de obedecer, e operar em você a própria ordem que Ele dá.

Com o ser humano, conhecer e querer, querer e fazer, até mesmo querer e executar estão, por carência de capacidade, muitas vezes separados, ou até mesmo divergentes. Mas isso nunca acontece com o Espírito Santo. Ele é ao mesmo tempo a luz e o poder de Deus. Tudo o que Ele é e faz e dá tem em si tanto a verdade como o poder de Deus. Quando Ele mostra a você o mandamento de Deus, Ele sempre o mostra como algo possível e capaz de ser executado, como um dom e como a vida divinamente preparada para você. E Aquele que os está revelando é poderoso para comunicá-los a você.

Amado estudante da Bíblia, aprenda a crer que é somente quando Cristo, pelo Espírito Santo, ensina você a compreender a Palavra e a recebê-la em seu coração, que Ele pode de fato ensinar você a obedecer como Ele mesmo obedeceu. Creia, toda vez que você abrir sua Bíblia, que tão certo como você ouve a divina e santa Palavrainspirada pelo Espírito, assim o Pai, em resposta à oração da fé e à dócil espera, concederá a vivificante operação do Espírito Santo ao seu coração. Faça com que todo o seu estudo da Bíblia seja matéria de fé. Não apenas prove e creia as verdades ou promessas que você lê. Isso pode ser feito pelo seu próprio esforço. Em vez disso, creia no Espírito Santo, na Sua presença em você, na operação de Deus em você através dEle. Receba a Palavra em seu coração, na tranquila fé de que Ele o capacitará a amá-la, a ajustar-se a ela, a guardá-la; e nosso bendito Senhor Jesus fará com que o livro seja para você aquilo que foi para Ele, quando falou a respeito das “coisas que estão escritas a Meu respeito”. A Escritura toda se tornará na simples revelação daquilo que Deus fará por você, e em você, e através de você.

III. O ALUNO

Já vimos como nosso Senhor nos ensina a obediência por meio da revelação do segredo de como Ele mesmo a aprendeu, em Sua permanente dependência do Pai. Já vimos como Ele nos ensina a usar o Sagrado Livro como Ele o usou, como uma revelação divina daquilo que Deus tem preparado para nós, com o Espírito Santo revelando e capacitando.

Se agora considerarmos o lugar que o crente ocupa na escola da obediência como aluno, haveremos de entender melhor o que Cristo, o Filho, requer para efetuar em nós a Sua obra com eficácia. Num aluno dedicado há várias coisas que despertam e estimulam sua simpatia para com um professor confiável. Ele se submete completamente à sua liderança. Ele deposita perfeita confiança no professor. O aluno lhe dedica tanto tempo e atenção quanto o professor requer. É quando nos apercebemos de que Cristo tem direito a tudo isso, e nos dobramos a isso, que podemos aguardar a experiência de quão maravilhosamente Ele pode nos ensinar uma obediência como a que Ele mesmo viveu.

1. O verdadeiro aluno, quer seja de um grande músico ou de um pintor, dedica a seu mestre uma confiante submissão de todo o seu coração. Quer seja na prática das escalas quer seja na mistura das cores, no lento e paciente estudo dos elementos de sua arte, ele entende que é sábio obedecer com simplicidade e inteireza. É essa submissão de todo o coração à direção do Mestre, essa submissão implícita à Sua autoridade, que Cristo requer. Nós nos achegamos a Ele suplicando que nos ensine a perdida arte de obedecer a Deus assim como Ele o fez. Ele nos pergunta se estamos dispostos a pagar o preço. Isso significa completa e total renúncia de si mesmo! Isso significa abrir mão de nossa vontade e de nossa vida até a própria morte! Isso significa estar pronto a fazer o que quer que Ele mande!

A única maneira de aprender algo é pela prática. A única maneira de aprender a obediência de Cristo é abrir mão de sua vontade para Ele, e fazer da vontade dEle o grande desejo e prazer do seu coração. A não ser que você se comprometa com a absoluta obediência no momento em que você entra nesta sala da escola de Cristo, será impossível fazer qualquer progresso.

2. O verdadeiro discípulo de um grande mestre considera fácil render-lhe essa obediência sem reservas pelo simples fato de que ele confia no mestre. Ele sacrifica com gratidão a sua própria sabedoria e vontade para ser guiado por outra superior. É dessa confiança que precisamos para com nosso Senhor Jesus. Ele veio do céu para aprender a obediência, para que fosse capaz de ensiná-la bem. A Sua obediência é o tesouro pelo qual não só o débito da nossa desobediência passada é pago, mas por meio do qual a graça da nossa presente obediência é suprida.

Em Seu divino amor e perfeita identificação com a natureza humana, em Seu divino poder sobre nosso coração e vida, Ele convida, Ele merece, Ele conquista nossa confiança. É pelo poder da admiração pessoal, pela afeição à Sua Pessoa, é pelo poder do seu divino amor, por toda obra efetuada em nosso coração pelo Espírito Santo, despertando em nós um amor que corresponde ao dEle, que Ele desperta nossa confiança, e comunica a nós o verdadeiro segredo do sucesso na Sua escola. Tão absolutamente como confiamos nEle como o Salvador que nos resgata da nossa desobediência, assim confiemos nEle como o Mestre que nos guiará para longe da desobediência. Cristo é nosso Profeta ou Professor. Um coração que com entusiasmo creia no Seu poder e capacidade como Professor descobrirá, para a alegria dessa fé, que é fácil obedecer. É a presença de Cristo conosco todo o dia que será o segredo da obediência verdadeira.

3. Um aluno dedica a seu mestre toda a atenção e aplicação que ele solicitar. É o mestre que diz quanto tempo tem de ser devotado ao contato pessoal e à instrução. A obediência a Deus é uma espécie de arte celestial, nossa natureza é tão completamente avessa a ela, o caminho em que o Filho aprendeu a obediência foi tão lento e longo, que não nos devemos admirar se o aprendizado não vem de uma só vez. Nem devemos nos admirar se for necessário muito mais tempo aos pés do Mestre em meditação, e oração, e espera, em dependência e auto-sacrifício, do que a grande maioria está disposta a dar. Mas disponhamos nosso coração a dar esse tempo.

Em Cristo Jesus, a obediência celestial se tornou humana outra vez, a obediência se tornou nosso direito de nascença e nossa natureza: apeguemo-nos a Ele, creiamos na Sua presença em nós e roguemos por ela. Com Jesus Cristo, que aprendeu a obediência como nosso Salvador, com Jesus Cristo, que ensina a obediência como nosso Mestre, podemos viver uma vida de obediência. A Sua obediência — não podemos estudar a lição com excessivo fervor — Sua obediência é a nossa salvação; nEle, no Cristo vivo, encontramos essa obediência e dela participamos momento após momento.

Supliquemos a Deus que nos mostre como Cristo e Sua obediência são de fato a nossa vida a cada momento: isso fará de nós alunos que Lhe dão totalmente o coração e todo o seu tempo. E Ele há de nos ensinar a guardar os Seus mandamentos e permanecer no Seu amor, da mesma forma que Ele guardou os mandamentos do Seu Pai e permaneceu no Seu amor.


Retirado do livro "A Escola da Obediência"

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